Pensei que fosses descansar a luz do sol
Que dia após dia
Rasga-se radialmente na sua pele
Endurecida por vaidades da vida
Na marcha solene de solidão
De ganhar um sorriso para alegrar
A alma despedaçada por vendavais sociais
Sim, descansar a luz do sol
Engravidada no ventre da noite
Noite que pare a luz da lua e das estrelas
Que te aquece carinhosamente
Deitada na sua cubata sem tecto
Coberta sim, dessa luz misteriosa
Na sua almofada solitária da palma da mão
Onde roeis o pensamento do próximo dia
Ouvindo os cânticos dos mochos
Que vão te serenando os maus presságios
E os galos precipitados cacarejam
Anunciando-te a chegada da alvorada
Para mais uma badalada da enxada
Bater violento sem força a terra
A luz do sol batendo a sua pele
Que te tornas sobrevivente
Dos mistérios do dia e da noite
E no fim da jornada do dia
A luz da lua e das estrelas ilumina seu quarto
Figuras penumbradas de feiticeiros
Presentes nos seus olhos e miolos
O cântico dos mochos ecoando nos teus tímpanos
São os teus companheiros, minha mãe
Condenadas a viver desarascando a vida
Nessa idade velhinha
Com uma dezena de filhotes
Paridos do seu único ventre
Na loja de amor sem clientes
Que hoje és feiticeira de seu próprio sangue
Sim, com meia dezena de filhotes
Casados e casadas
Gozando aconchegos pelas cidades
Em casas cobertas de luz artificial
Os pés acelerando aceleradores modernos
As mãos teclando a enxada de computador
Os dedos dedilhando as melodias das almas...
E os lábios, minha mãe
Sorvendo todas as bebidas
Que desaguam no estômago
Junto de diversidades de carnes
Devoradas pelas ferras de dentes
Que fazem o estômago arrotar regalias da vida
E tu, minha mãe
Mãe de uma dezena de filhotes
Feiticeira do seu próprio sangue
A dedilhar a alma da enxada
No palco de espectadores de capim e poeira
Pés acelerando o carro de areia à busca de água...
Engolir a matapa sem amendoim
A cobrir a luz da lua e das estrelas
Naquela cubata sem paredes e muito menos tecto
Quando serás verdadeira mãe
Aos olhos dos teus dez filhotes??
15.07.09
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