quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Na baía (2)

Aqui as mulheres cantam o orgulho de serem moçambicanas ou africanas
No espectáculo da noite espessa em que o sono foge,
Corre para a baía vislumbrar a magia da rede que pesca o sorriso do pescador...
Ou para a festa do sol abrasador que tenta impedir a percussão do xigubo da coluna
No palco da machamba que nem mandioca para tapiocar traz...
Ou para acudir o giz que seca nas mãos do professor antes de, pedagogicamente brilhar nas mentes dos alunos...

Minha casa não é aqui, é no sussurro das ondas da baía,
Sentado no banco da areia despida pelo vaivém das águas,
Possuído pela melodia do Índico onde pelas noites me lanço entre os suspiros dos sonhos das mulheres bitongas, matswas, machopes e doutras mulheres de moçambique ou de Africa…
Que deambulam à risca de violar as algemas da pobreza que cada dia arrasta mais reclusos...
À prisão machista guarnecida pela musculatura da masculinidade social,
Que nada conseguem se não despir a naturalidade da sua beleza esculpida pelo ventre do Índico...

Na baía os sonhos não morrem no sono como o peixe morre na rede,
Os sonhos atravessam a alvorada de canoa até ao raiar do sol,
Mesmo que signifique gelar sangue pelas aguas,
Rebentar as mãos nas rochas ou na terra seca,
Emprestar a consciência na doutrina de dizimos,
Ou pendurar a verdade em nome da verdade politica...
À esta margem da vida em que as acções do sonho se cruzam no cumplice ganancioso desta devastadora civilizacão...

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Na baía (1)

Aqui os olhos fundem-se no vaivém dos barcos pintados de negro natural das tintombi da baía,
As vozes perdem-se na melodia afinada da mulher bitonga, matswa, machope...flutuando pelas serenas ondas da baía.
Eu nao sou da baía, vivo na baía povoada...
Onde as mulheres pela madrugada puxam rede de pesca,
Selam os lábios e deixam sua beleza pintar a esteira do chão onde todos querem estar...

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Meu Chão, Meu Mundo, Minha Vida...

É neste tapete onde me encontro tapetado
É nesta alcatifa onde sento alcatifado
É nesta esteira onde me estiro esteirado
Coberto de nudez empoeirado…
Untado no espesso luto de ser africano…
No atilier artístico das artes de politizar e de milagrar...

Chega o Verão, o carvão do chão aquece
Chega o Inverno, o Índico do chão resfria
Chegam vozes, o chão acolhe-as
Partem vozes, o chão acompanha-as
Ao chão sempre presente na chegada e na partida...

Não há Inverno nem Verão
O chão ouve os profetas refilando…
O chão ouve os ossículos vacilando…
O chão ouve as doutrinas e os versículos envangelizando…
O chão ouve as ideologias... reinando…
O chão ouve os búzios buzinando…
Em palcos tortos em que as timbilas do chão e do céu
Não páram de governar-me de seus sons…
Poluindo os tímpanos da ciência ignorada...

Não há noite nem dia
Não há idade nem cor
O chão banha das minhas lágrimas
O chão bebe o meu sangue
O chão ouve os meus gritos
O chão cobre o meu luto
O chão embala-se no sono dos homens obrigados a atravessar o chão
Neste vaivém de abrir e fechar as portas deste chão...

Não conheço chão alegre...
Neste chão onde me encontro aprisionado
Na prisão vigiada pela lei biológica enrabada pelas vozes...
E na liberdade onde apenas a lei da morte reina
Na luz de plenos poderes do chão e do céu...

Neste chão
Eu nasço…
Eu cresço...
Eu vivo…
Eu morro…
E na magia de rebentar as correntes da morte...
Volto a viver a vida...

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Minha Vergonha

As vezes sinto vergonha de dizer que sou africano,
Que sou moçambicano...
Que sou humano de qualquer floresta...
Quando vejo que, os que me governam...
Estão mais atarefados em fabricar discursos e leis para nós o povo,
Entretendos-nos, enquanto isso, eles enchem seus bolsos e panças
Por aquilo que faria-nos sorrir...
E os que deviam pegar na espingarda da justiça lutar
Estão possuídos por veneno de mordomias...
Gratificados pela ginástica do punho que apunhala a nossa dignidade...

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Globalização, íman sem fronteiras

Cabe aos tradicionalistas travarem batalhas duras
Cabe aos maestros conservadores inventarem todos os hinos
Mas a globalização, cada dia avança, cada dia invade,
Cada dia aterra ou atraca…
Cada dia implanta-se, dita regras no consciente ou no inconsciente…

Assim cabe a própria estrutura social socializar-se,
Readaptar-se ou reestruturar-se
Ou simplesmente enforcar-se…
Neste íman sem fronteiras, sem segredos…

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Terra de Boa Gente

Nas espessas sombras da frescura da baía
Sussurrados por marés vazantes ou enchentes
Evacuando as maravilhosas conchas nuas pela marginal
No belo nascer e pôr-do-sol sorridente
Que nasce ou morre espetado no azul das águas serenas
Onde riquezas de espécies marinhas multiplicavam-se
Na inocência dos anzóis e redes que viriam em massa…
No longínquo ano de 1498,

Conheceram-te...

Nas tuas sombras de solidão natural
Nas tuas escamas de virgindade…
No teu cúmplice humilde gesto humanitário
Entre correntes quentes e frias correndo nos teus belos seios…
Navegados pelos homens do além
Chegados de grandes e longas viagens
Despiram seu calor da Europa...
Impregnaram-se na frescura que ofereces…,

Entregaste-te, sem lobolo, terra sem cidade…

No orgulho das algemas de suas terras virgens
Como o próprio povo humilde e inocente
Que de suor soante, esverdeou-os:
De trigo, de arroz, de sisal…
No recheio de xigubo… de opressão
Temperado de precursão de temperar azedamente a pele…,

Prostituíram-te, minha terra e meu povo…

Sentiram o doce carinho acariciante
Que vem deste povo humilde do Índico
Indicado a viver nesta baía adorada
Pelas canoas e barcos a vela
Roçando carinhosamente as ondas serenas
Pelas marés enchentes navegantes
Na mistura de sons de melodias de línguas locais
Localizadas no interior da identidade deste povo,

Apelidaram-te…
Terra boa
Gente boa
Terra de boa gente!

De suor vergado dos poros excitados
Provocado pela tesão dos músculos masturbados
Na evaporável viagra do chicote do além
Electrizando corpos de homens e de mulheres
Acorrentados dos pés até ao pescoço
Na marcha bárbara da construção de ti, Inhambane
Outros homens misturados no betão dos edifícios e das estradas
Sangue amassando cimento ou pintando rupestre as obras…
Outros ainda, acorrentados, chicoteados…
Construíam a linha férrea ferrada…
Ou ainda, eram vendidos para outras terras
Para construir as gigantescas economias…
Que hoje, este seu povo “liberto…”
Vivendo nesta ou noutras cidades deste belo Índico
Vagueia na dependência económica…
Nesta máquina de contínua opressão…

Gente boa
Boa terra
Terra de boa gente…,
Inhambane

Pequena cidade, maravilhosa arquitectura
Linda cidade, conservadora de explicação histórica
Ambiente sereno, povo acolhedor
Cúmplice solidão, armadilha de atracção…
De companhias inesgotáveis pelo Inverno e Verão…

Feliz Aniversário (12/8)

quarta-feira, 7 de julho de 2010

As malas…

Do académico: o método;
Do político: a ideologia;
Do padre: a bíblia, a doutrina.

E qual é a mais pesada?

O método, que carrega e vê todos os ângulos:
Do político, do padre, da sociedade
Onde o único produto em disputa é o povo.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Mawaku os que Não se Endividam!

Sempre que o sol raia
Raia-me a matemática no cérebro
Martelam-me as equações da vida
Com resultados positivos ou negativos…

Sempre que o sol esmurra-se no travesseiro do escuro
Ressuscito-o nas mantas sem conforto
Na nudez de janelas mortas pelo silêncio
Jogando contas no quadro da vigília
Magicadas de soluções sem resultado
No tagarelar silencioso do cérebro
Que mergulho no longo e prolongado silêncio nocturno
À busca de solução da equação da vida

Vasculho o espírito protector
Só me cobra mhamba…
Rogo Deus na cortina de milagres
Só me cobra dízimos…
Chamo a responsabilidade do poder…
Só me entulha de inúmeros e elevadíssimos impostos…
No rio de discursos de possibilidades impossibilitadas

Vou sobrevivendo endividado
No banco do coração
No banco do estômago
No banco do cérebro
No banco de patriotismo -
Onde os juros custam-me sangue e sofrimento
Sem que ninguém me acuda!

Mawaku os que vivem sem dívidas
Que apenas precisam e fazem
Matemáticas para subtrair os meus juros
Nesta vida que em todos os bancos estou endividado
Mawaku, mawaku, mawaku eles…

Estou sufocado desta vida
Mas a saída é continuar endividar-me
Juros chicoteando-me o cérebro
Machucando-me o coração
Roçando-me o estômago
Varrendo-me o orgulho de patriota -
Nas matemáticas feitas pelos outros
Das contribuições sem destinos
De impostos cada vez diversos e altíssimos
Coercivamente colectados pela lei inquestionável…
Mawaku, mawaku, mawaku…

Mesmo que deixe de amar
O banco da solidão me cobrará

Mesmo que deixe de comer
O banco da fome me cobrará

Mesmo que deixe de trabalhar
O banco de desemprego me chicoteará

Mesmo que deixe de estudar
O banco do analfabetismo me sufocará

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Meu SER Penhorado

Nasci pintado do meu ser de ser Eu
Quando me descobriram que não era Eu
Provindo de um ventre de outras cores
Mesmo na mesma floresta humana

Vasculhei os passos do meu ser
Nos arbustos de identidade humana
Onde sopram ventos do mesmo ser
Brilham cores de todas belezas
Desfilam as gramáticas de toda humanidade
Onde me encontro perdido
Talvez sem identidade, não importa
Talvez sem cor, não interessa
Ridicularizado e humilhado
Escravizado e explorado…
Coisas dos gulosos e predadores

Sei apenas que sou ser humano
Nascido de um ventre
Não interessa se é do Norte
Se é do Sul, Este ou Oeste
Se é da África ou da Ásia
Se é da América ou da Europa
Ou doutras e outras partes

Encontro-me na mesma espécie
Onde identificamo-nos pelo mesmo código
O código de fala ou de gestos
Mesmo que as gramáticas sejam diferentes
As necessidades são as mesmas
Nesta teia de aranha que interliga-nos
Na magna floresta humana
Onde construímos os nossos relacionamentos

Serei diferente dos outros?
Não!
A espécie humana é a mesma
Que se encontra no Norte ou no Sul
No Oeste ou no Este
Na África ou na Ásia
Na América ou na Europa
Ou em outras e outras partes

Embora com gramáticas diferentes
Somos todos humanos
Dependemos do mesmo oxigénio
Embora tenhamos gulosos
E predadores da mesma espécie
Somos todos humanos
Seres humanos
Com faculdades de pensar e agir

Não importa se somos pretos ou amarelos
Azuis ou vermelhos
Brancos ou rosas
Não importam as nossas crenças
Todos construímos e reconstruímos a ciência

Povoamos e repovoamos a nossa espécie…
Com o mesmo poder de espermatozóides
Ninguém ejacula de ouro ou de prata
De diamante ou de bronze
Todo ventre fecunda o que gera a minha identidade

Que me resta?
Salvar-me dos gulosos e de predadores
No combate às injustiças sociais
Às imposições de exploração e escravidão
Do neocolonialismo…
Construir a minha própria economia
No dia em que saberei melhor gerir a coisa pública

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Poetando-me poeta

Redescubro-me na sombra do silêncio
Na maca da solidão marchante
Coroada de coágulos de dor dolorida
Nesta melancolia de vomitar o sofrimento
Que pinta artisticamente este caqui
No contraste da balalaica que me aquece avidamente

Dor é sentir a dor
Sorriso é deixar a dor falar
Felicidade é compreender a fala da dor
Entre amar e ser amado

Ou entre governar e ser governado
Nesta vasta floresta da humanidade
Em que o predador do Homem
É o outro Homem jazido na sombra da sociedade
Onde poeto-me poeta

sábado, 22 de maio de 2010

Feliz dia do trabalhador??!!

Trabucas trabalhador
Operário operando miséria
Com veias endurecidas de labor
Em troca de salário?
Que compra nada de cabaz
Que crianças até aprendem a phandar…

Matutas-te a cabeça
Operando operário miserável
Na miséria sem protecção condigna
Da lei labor que de sua força ergue poder
Economicamente económico poderoso
Patrão que te discursa severo…

Matutas operário
Trabucas trabalhador
O muchine das veias precisa arrancar
No trabuco sem horas…
No recheio de paleios seus agasalho e alimento
Nesta camuflada escravatura
Sofisticada de técnicas de opressão…

Vá, ergues-te escravo
Destilas seu suor no alambique da opressão
Que patrão ergue sua vaidosa riqueza
No conforto de escravizar-te
Continuamente empregado desempregado
Com salário que te chega aos centavos…
Vezes atrasadíssimo
E porque não vezes sem nada
Açambarcado no vulto de impostos…??!!

1/5/10

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Quando ser outro dia

Será o dia a mudar
A hora o minuto a marcharem
A temperatura temperando-se
No temperamento de frio ou de calor

Tudo em marcha marchando
Neste esburacado asfalte da modernidade
Que moderniza as mentes, os corpos,
Os sentimentos, enfim, as relações sociais
E porque não comerciais, políticas, religiosas…??!!

Eu serei a luz desse dia
Firme e presente
Como as ondas do mar
Na escravatura do meu juramento
De fazer-te sempre feliz
No tempero moderado de sentimentos
Mesmo quando ser outro dia…

sábado, 24 de abril de 2010

Nostalgia e Inverno

Trepo as escadas da tua ausência
Do edifício erguido de amor
Pintada rupestremente de felicidade
Entre cores de fidelidade, carinho, compreensão…

Lá encontro uma bandeja repleta de nostalgia
Neste tempo ameno de Inverno
Em que as acácias ficam nuas
E o corpo humano procura mais agasalhos

O meu agasalho és tu
Não apenas para este Inverno vaidoso
Mas sempre imprescindível
Para manter viva as cores
Do belo edifício erguido de amor…

Vou-te esperar tocando amavelmente
O assobio arrepiante nostálgico
Trepando as escadas da tua ausência
Neste inverno vaidoso
Em que a minha vaidade
É agasalhar-me de saudades tuas…

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Óscares pela Humanidade

Sou actor da minha própria extinção
Nesta longa-metragem
Distinguida pelas qualidades técnicas
Bárbaras de encenação industrial
Galardoada com medalha sangrenta
No salão de Óscares da humanidade

O trilho sonoro rola no meu filme
Embarca do Pacífico
Do Índico
Do Atlântico
Do Glacial Antárctico
Do Glacial Árctico
Com veemência melódica
Dos gritos das vítimas presas
No episódio do espectáculo demolidor

O protagonista é a minha mente
A acção a minha força
A vitória a minha tristeza
Dos abrigos varridos
Da minha brava encenação industrial
Desde o Atlântico ao Índico
Do Pacífico aos Glaciais Antárctico e Árctico
Na festa dos Óscares demolidores
Com melodias de gritos desafinados
Onde espectadores alguns dançam nus
Ao relento sem abrigos
Ou talvez apertados dos escombros que restam

De corpo erguido e agasalhado
De mente lúcida e equipada
Dentre muitas luzes acesas
Em enciclopédias jazidas empoeiradas em bibliotecas
Sigo o meu caminho ignorante
Que me torna actor protagonista
Deste filme de longa-metragem
Distinguida pelas qualidades técnicas
De encenação bárbara industrial
Galardoada com medalha sangrenta
No salão de Óscares pela humanidade

quinta-feira, 8 de abril de 2010

O presente que não se oferece!

Sem data e sem horas
Sem espaço e sem tempo
Sem excepção na regra
Há sempre movimentos nas ruas e nas avenidas de corações
Num vaivém melancólico ou alegre
Ao destino achado ou fugitivo

Gastam-se milhões de contos
Queimam-se dezenas de horas
Percorrem-se milhares de quilómetros,
De avião, de carro, de motorizada, de bicicleta, de cavalo e,
Porque não a pé?
À busca de qualquer coisa de testemunho sentimental
Seja no exterior ou no interior dos mercados de sentimentos

De volta as mãos estão carregadas
Os bolsos mais inchados e pesados
Lábios com leveza frescura de astúcia
A mente fritando ingredientes adestrantes
E coração esvaziado pelos bracejos do vazio de sentimento
Num olhar que não luza segredos ocultos na pista de amor
Encurralados no brilho de presentes em marcha…

São presentes que alegram os olhos por vê-los
Emocionam os corações por recebe-los
E entristecem os sentimentos por tê-los
Pois, verdadeiro presente, neste campo de sentimento,
Raro e dificilmente os amantes oferecem-se, a FIDELIDADE!

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Doce olhar

Li na curva de seus olhos
Que o olhar é também doce e sedutor
E, entre as mil maravilhas que o corpo dispõe
Ele, o olhar, é a força que capta atracões sentimentais

Nas curvas invisível ou visível
Está presente e determinante
Desbravando completo ou incompleto
A mata das pálpebras dos olhos sedutores ou melancólicos
Para que a luz dos olhos olhantes
Luza o passageiro em sua direcção, eu

Li no cruzamento de seus olhos
Que o olhar é também forte, invencível e mediador
De desassossegos entre corações gritantes
Na planície do festival de amores…

Mergulha a sua luz mágica
Rompe com as correntes das mágoas
Electriza os rostos de sorrisos
E prende acesa a luz doce da curva dos olhos

E no entroncamento de seus olhos
Li que às vezes ninguém consegue compreender-te
Naquela mágica adrenalina presente ou silenciosa
Desnudada ou agasalhada de pálpebras mudas
Como o misterioso raio do satélite que nos chega invisível

segunda-feira, 29 de março de 2010

Cabaça

Trilho em caminhos sombrios
Carregado do meu casaco no ombro
Com a cabaça de mata sede na mão
Na longa caminhada finita da vida
Onde finto o meu próprio caminho

Lá vou eu
No perambulo da minha babalaza
Banhado de suor do meu Índico
No cântico da minha canção
Que me vem da profundeza do rio da vida

Trespasso longamente a floresta esverdeada
Em desequilíbrio acentuado de meus passos
Com a cabaça da vida na mão
Assobiando sereno nas folhas verdes da floresta
Que despertam mortas das flechas arrogantes do Homem
Cintilando-me nos olhos recauchutados de babalaza
O último adeus de sua densa naturalidade

Escalo o calor do Índico
Embutido na minha cubata pintada de negro
Ouvindo suspiros da melodia da vida
No espectáculo das vozes guilhotinadas…
Dedilho minuciosamente a guitarra
No sorvo doce do líquido da minha cabaça
Que a cada gole estrangulado
Estrangula ou cria a minha babalaza companheira

quinta-feira, 18 de março de 2010

Recluso vigiado

Degusto o prazer árduo da cela prisional
Preso na emboscada da luta de liberdade da fala
Travada no campo da batalha da luta das verdades
Entre a liberdade de falar as verdadeiras verdades
E a liberdade bélica de escamotear as verdades perversas

Arrisco secretamente polir e lubrificar a minha arma
Na sela vigiada vinte quatro horas
Por homens armados dos pés até aos dentes
Que até seguem a minha sombra
Mesmo nas esquinas escuras da cela
Para imobilizar o disparo da minha arma

A minha arma não é bélica
Mas ela é poderosa
Ela não dispara para matar
Apenas para dissipar dúvidas
Esclarecer verdades
Ou mesmo para dizer as verdades
Escondidas no poder bélico

A minha marcha é longa
Nem com isso vou desistir
O meu inimigo é bravo
Mas o enfrentarei
Sempre com a minha arma, a palavra
No disparo sem sangue

Tenho consciência de tudo que é
Tenho a certeza de tudo que faço
Tenho a convicção de tudo que quero
Nesta penitenciária
Em que o bom recluso
É aquele que parafraseia ordens
Enterra a sua sabedoria
E veste máscaras de ideologias…
Em busca de pão
Para a sobrevivência da sua pança

A minha marcha é longa
Nem com isso vou desistir
O meu inimigo é bravo
Mas o enfrentarei
Sempre com a minha arma, a palavra
No disparo sem sangue
Em busca da minha total liberdade
Liberdade de expressão
Liberdade política
E dignidade de ser
Um verdadeiro cidadão democrático

segunda-feira, 8 de março de 2010

Meu ventre

Deixem estas palavras viajarem
No saltitar da voz eufórica
Aquela voz que canta orgulho
De ter sido nascida de um ventre humano

Hoje e como outros dias…
Grita humanamente reconhecendo
O ventre que lhe fez conhecer este universo
Este universo que ainda te escraviza, mulher
Baseado nos fundamentos do código social
Na doutrina religiosa
E nos cárceres de ideologias políticas

Eu
Dispo o casaco da minha masculinidade…
Sopro-o para agasalhar a terra fria de Inverno
E visto o casaco humano
Que agasalha a tua e a minha pele
Nesta longa marcha, mulher
De reconhecimento das nossas igualdades sociais
E das diferenças biológica

quinta-feira, 4 de março de 2010

Vozes doutros filhos desta nação


Somos filhos desta nação
É esse o nosso fardo de orgulho
O nosso timbre que nos faz diferente
Talvez doutras crianças nesta mesma nação

Somos filhos desta nação
Faça sol
Faça frio
Trepamos a distância da areia
Com pés vestidos de nudez
Rumo ao encontro do alimento da mente

Somos filhos desta nação
Inocentes das perversidades desta nação
Erguemos a humildade da nossa existência
Tocamos xitende
Tocamos xindiro
Assobiamos a fantasia da marrabenta
Mesmo com lábios pintados de palidez
Mesmo com a pele sem agasalho
Mesmo com tripas vazias
Rumamos ao encontro do alimento da mente

Somos filhos desta nação
Faça sol
Faça frio
A distância agasalha-nos os pés
Os calcanhares endurecidos pela teimosia de lá chegar
Ao encontro do quadro do abecedário
Erguido debaixo da árvore
Que jaze nu como os nossos rostos pálidos
Rodeado e esplêndido de nossos olhares
Carregados de desejo de aprender

Lá chegamos
Aprendemos o poder das palavras
Aprendemos a magia dos números
E assim alimentamos a nossa mente
Debaixo da árvore
Com nádegas fixas na areia ou num tronco qualquer
Que é esse o nosso orgulho
O timbre que nos faz diferente
Talvez doutras crianças nesta mesma nação

terça-feira, 2 de março de 2010

O atirador que não falha (HIV E SIDA)

Bicho venenoso
Açambarcador de vidas humanas
Comercializadas no mercado de inferno
Ao preço de luto e sofrimento á humanidade que resta
Nas sombras de agasalhos de estigma e descriminação

Guerreias os homens na guerra do seu combate
Ergues-te de poderes poderosos
E vacilas o Homem de virtudes imprudentes
Na terapia dos prazeres sexuais irresistíveis
No ritual transfusão de sangue (mercado tradicional e moderno)
Que ousa perambular de olhos vendados

Rios de dinheiro são espalhados pelo mundo
Milhares de vozes armadas disparam todos os dias
Nas mentes de todos nós
Mas o alvo continua ainda fugitivo
Que nas tácticas de guerrilha
Acerta-nos a cada esquina onde tentamos disparar
Pois nós disparamos de olhos vendados

Nem com isso vamos cessar as armas
Apenas precisamos redesenhar a estratégia de combate
Militarizarmos efectivamente todo homem alvo
Nos campos da tradição, da religiosidade e porque não da política?
Porque nós encontramo-nos em terreno vantajoso:
Temos militares cientistas da medicina humana
Temos militares cientista da psicologia humana
Temos militares cientistas da sociologia humana
Temos militares cientistas da antropologia humana
Temos militares cientistas planificadores, gestores, implementadores…
E ainda temos militares monetários…

E o nosso inimigo, que tem capaz de derrotar-nos?
Nada tem senão a parte da nossa distracção…
A parte da nossa ignorância…
A parte da nossa cobardia embrulhada na superstição…
A parte da nossa cobardia embrulhado em algumas crenças religiosas
A parte da nossa astúcia incubada na avidez
Do material doado para a nossa luta…
Que apenas é justificado por números
E não pelas técnicas qualitativas de disparo

segunda-feira, 1 de março de 2010

Sangue em Açambarcamento (5) - fim

Em todos os bazares
Da governação
Do amor
Da religiosidade
Da macumba
Da labuta
Lançam-se iscas de promessas
Na disputa do mesmo produto
Que engorda os detentores dos poderes desses bazares

E nós o povo
Grulhamos a esperança das promessas
No açambarcamento do nosso sangue
Disputado em todos bazares
Aqueles bazares que governam a espécie humana
Essa nossa espécie humana
Desumanizada pela escravidão da irmandade

Sim, é mesmo escravidão
Uma escravidão sofisticada
Em que o escravo convive com o explorador
No cativeiro da distância entre o pobre e o rico
Que a exploração, humilhação, adestramentos…
São as sentenças da nossa condenação
Sentenciadas pelos juízes pobreza, corrupção e guerras…
E assim
Nós vivemos as promessas
Promessas de boa governação
Promessas de milagre e salvação
Promessas de bom convívio com os nossos mortos
Promessas de amor eterno
Numa eternidade desenterrada pelas promessas

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Sangue em Açambarcamento (4)

E no bazar da religiosidade?
É o apogeu do cúmulo de mistérios
Embutidos nas iscas de milagre e salvação
Que pescam os mariscos de diamante e ouro
Jazido nos bolsos de crentes…

Acorrentados pela corrente da psicologia hipnótica
Dentro da prisão de esperança de milagres e salvação
Soltam tudo quanto podem (jóias, dinheiro, casas, carros, etc.)
Em nome dos dízimos ao milagroso e salvador senhor
Que mais tarde só se cantam melodias melancólicas
Em corro de arrependimento…
Apenas para quem consegue escapulir-se dessa prisão…

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Sangue em Açambarcamento (3)

No bazar do poder político
Lançam-se iscas de promessas
Embutidas em discursos alucinantes
Da veste esfarrapada de ideologias políticas
Que esfolam as veias da irmandade
Ao abrigo de leis e políticas…
Cromadas a vapor de deveres ao povo
E revestidas de injustiças no cúmulo da sua aplicabilidade

Nesse bazar o sangue derrama a jactos
Gira em torno dos comerciantes da política
Rega-lhes tranquilamente os caprichos da gula
No comércio da governação que lhes gera riqueza
Enquanto cânticos de luta contra a pobreza absoluta
De luta contra a corrupção
Contra todas as injustiças sociais
Vão animando o povo adestrado…

Sangue em Açambarcamento (2)

No bazar de amor
Lançam-se iscas de promessas
De amar-se até á eternidade
Entre juramentos de fidelidade
E de partilhar todos os momentos da vida
Desde os da felicidade até os agónicos
Na luz de mistérios de leis convencionais
Rogando a bênção do poderoso criador…

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Sangue em Açambarcamento (1)

Vidas são açambarcadas
Nos bazares de amor…
Da governação…
Da religiosidade…
Ao preço de ávidos interesses obscuros
Dos açambarcadores do sangue da irmandade…

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Objectos do Finado

Não, eles são do finado
Não morreram
Apenas carregam angústia
Dor e solidão acasalados
Na capoeira de abandono e bagunça

Eles não falam
O finado sim vociferava em vida
Eles não falam
Só brilham no camarim das disputas
Entre esquivar olhos gulosos
E vozes precipitadas
Até mãos atrevidas
Que nem respeitam as regras do jogo…

Mas eles não falam
São objectos do finado
Brilhando nos mistérios das tradições
No altar silencioso da fala

Precisam ser falados para falar
Falar a quem lhes pertence
E como os deverão usar
Pois eles não falam
São objectos do finado…

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Mae

Oiça a minha voz
Que dança melodias de saudade
De invadir teus tímpanos
Ao encontro de ti, mãe

Está carente de ti, mãe
Nem meus olhos te alcançam
Nesta distância que mata
E enterra a minha voz

Mãe
Sei que não me esqueceste
Tenho certeza que me contemplas
No teu pensamento como tua preciosa jóia
Que me polis a cada pulsar de seu coração
Nessa distância distante
Que nem os meus olhos te alcançam

Tenho certeza em mim
Que um dia vais voltar
Beijar-te o rosto enrugado
Deliciar-me da tua voz já melancólica
Sentir as tuas mãos escamosas
Bronzeadas talvez pelo carinho do cabo da enxada…

Eu
Aguardo-te com todo carinho de filho
Nesta minha idade avançada
Pasmada pela nostalgia…
Que mesmo com o tempo
Nada se apaga, mãe.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Samora Machel

Tapete Vermelho

Homem que pisa tapete vermelho é bebedor do sangue do seu povo

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

A festa dos Sexos!

Os dias da festa se avizinham
Se bem que não são estes
Que de boca em boca
E mesmo aquelas bocas sem palavras
Rumam ao mesmo destino…

Muitas ensaiam a mesma melodia
Na batucada de beiços
Para que nesse dia
A festa do labor das ancas
Rebente as cordas vocais
Nos gritos gemidos
Aos calafrios prazerosos dos sexos

E
Misterioso espectro segreda-me:
Há gente sequer sabe do dia da festa dos sexos
E ainda organiza outras festas:
Arranca a pele da mulherada ou da homenada
Fabrica seus batuques
E na azáfama de sons misturados na pele
Dançam Marrabenta
Mapiko
Xigubo
Zore
Xingomana
Ngalanga
Etc.
No prazer azedo da ribalta das agressões
Que avermelham os rostos
Invadidos pelas lágrimas de dor…

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Ávido

O homem é prisioneiro da avidez...

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

No dia que serei pessoa...!



Vou lutar para ampliar o universo
Para conceder espaço só para mim
Como os meus líderes bem protegidos…

Porque no dia que serei pessoa
Quererei tudo para mim
Como os meus líderes têm tudo só para eles…

Quererei tudo para mim
Tudo que não cabe no estômago do povo
Tudo que não cobre uma cabeça como a minha
Tudo menos um sorriso para mim
Neste mundo que carrego todos os males…

No dia que serei pessoa
Vou gritar para ser filha de alguém
Vou ressuscitar as leis para ser cidadã de um país
Porque neste universo
Eu continuo cidadã desprotegida
Continuo filha escravizada

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Tonitruoso

Vozes embaladas na melodia da dor
Dançam a saga malariada marrabenta
Que vibra os músculos das vítimas
Electrizadas pela fúria da dor dançante
Na sacanagem sucumbir até a morte
Quando a dança é dançada
Sem olhares atentos do telespectador mágico

Malária
Torturas o corpo humano
Amolece-lhe os músculos
No retumbar das vozes que as vezes calam mortas
Das crianças inocentes da tua sacanagem
Dos adultos molestados pela ignorância do uso de medidas preventivas
Ou daqueles que não as conhece e não as tem…

E eu aqui
Junto o meu grito aos que gritam para vencer-te
Junto a minha força aos que lutam para erradicar-te
Pois se todos unirmo-nos por esta causa
Comprometermo-nos e agir
Um dia, tu malária
Perderás esta batalha retumbante
E nós corpo humano
Cantaremos vitória…

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Perambulando

Salgo os passos na terapia da distância
Que dista o destino nostálgico doutra parte distante
Na distância apenas presente na distância de pensamento
Que resmunga-se na magia mágica de sexos opostos

Perambulo a mágica distância do nosso juramento
Na estrada alcatroada de firmeza coração
Dentro do veículo amor recíproco
Que continuas distante de mim

Mas eu
Viajo contigo passageira amorada
Dedilhando o sabor da magia presente de felicidade
No palco da fidelidade fiel da distância distante neste presente
Do real destino que salgo os passos na terapia da distância…
Á busca do ingrediente que faz de nós
Perambular a nostalgia do nosso ser…

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Defuntos da Minha Terra

Fecha-se a cortina da vida
Na festança de gritos da dor dilacerante
Em que deuses chamam a alma ao céu
O corpo esperado pela terra esfomeada
E o espírito de regresso vivo aos olhos dos que restam
Que navegam em ondas bravas de lágrimas doloridas
Na penumbra melancólica de ressuscitar o defunto da minha terra

Na minha terra
Defuntos voam no voo do avião
Ou na boleia do rasgar das quatro rodas
Despedaçando milhar de quilómetros
Atrás da terra que lhes viu nascer
Apenas para serem feitos estrumes…
Na longa distância dos que restam
E dessa campa cimentada pelo abandono…

E na fúria de abandono
Destapam a manta da urna
Violam a corrente da morte
E invadem a privacidade dos vivos
Que se tornam escravos escravizados
Pelos defuntos da minha terra

Na minha terra
Defuntos vivem em mansões
Agasalham-se em sedas e veludos
Nas cerimoniais em que os vivos
Engrossam -lhes de sangue de animais…
Empanturra-lhes de xima e carnes…
De fumaças tabagistas
Em reconciliações recomendas pelos juízes ossículos
Na tremenda convivência entre os vivos e os mortos

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Eu

Sou o epicentro das atenções
Mas somente nas vésperas da grande festa
Todos falam bonito de mim
Constroem-me abrigo na ciência das palavras
Enchem-me a pança de ingredientes de ilusão

Eu
Sou o epicentro das atenções
O anzol caça-me veemente
Em águas das avenidas e ruas
E até dos becos do subúrbio e do rural
Por onde pouso a minha pobre pobreza empobrecida

Tudo está lindo no papel
Soa aparente realidade nos meus ouvidos
Mas é apenas uma realidade ávida e volúvel
Carregada de letras embrulhadas pela astúcia
Na eloquência das palavras esculpidas
Somente para pescarem-me a tinta
Para legitimar-lhes…

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Dor de um Condenado...

Que me beneficia ser honesto
Se a própria autoridade não escolhe
Entre os honestos e os delinquentes?

Os calabouços engolem os honestos
E as leis absorvem os delinquentes
Que gozam de imunidades…
Na marcha sangrenta fogosa
Que prospera pobreza aos pobres inocentes
E prospera prosperidade aos delinquentes criminosos…